Acupuntura na Recuperação Pós-Operatória Ortopédica: experiência pessoal, evidências científicas e caminhos para uma reabilitação mais integral
- Paulo Henrique Mai

- 22 de nov.
- 6 min de leitura
Meu nome é Paulo Mai, sou médico acupunturista, e hoje vou compartilhar com vocês minha experiência pessoal e as principais evidências científicas acerca da Acupuntura para uma reabilitação integral no pós-operatório de cirurgias ortopédicas.
Em 2018, vivi na pele algo que transformou profundamente minha maneira de entender o cuidado em saúde. Quebrei a perna. E, como acontece com muitas pessoas, o pós-operatório foi um período marcado por dor, limitação, ansiedade e aquele misto de pressa e medo que só quem já passou por uma fratura conhece. Durante a recuperação, encontrei na acupuntura uma ferramenta que não apenas aliviou sintomas, mas me ajudou a caminhar, física e simbolicamente, de volta ao meu próprio corpo. A experiência foi tão marcante que acabou se tornando um ponto de virada na minha trajetória profissional, motivando minha formação como médico acupunturista.
Hoje, como especialista em Medicina de Família e Comunidade e Acupuntura, percebo como essa prática pode ampliar a qualidade da reabilitação ortopédica quando utilizada de forma integrada, responsável e baseada em evidências.
Este texto é um convite para entender como a acupuntura pode auxiliar na recuperação após cirurgias ortopédicas, o que a ciência diz sobre isso e por que, em muitos casos, ela se torna uma aliada valiosa do processo de cicatrização e retorno à funcionalidade.
Por que a Recuperação Pós-Operatória Ortopédica é tão desafiadora?
Cirurgias ortopédicas envolvem, quase sempre, três grandes questões:
Dor, decorrente da lesão inicial, da manipulação cirúrgica e do processo inflamatório.
Edema (inchaço), que limita mobilidade, atrasa cicatrização e alimenta o ciclo da dor.
Alterações do equilíbrio neurofuncional, o corpo passa por mudanças na forma como músculos, articulações e sistema nervoso se comunicam após uma fratura ou imobilização.

Além disso, há aspectos menos visíveis, mas igualmente importantes:
impacto emocional,
medo de se mover,
perturbação do sono,
tensão muscular compensatória,
sensação de “desconexão” do membro operado.
O grande potencial da acupuntura está no fato dela atuar justamente nesses múltiplos níveis: biológicos, emocionais e funcionais.
O que a ciência mostra sobre acupuntura no pós-operatório?
Nos últimos anos, estudos clínicos e revisões sistemáticas apontam benefícios consistentes da acupuntura como terapia adjuvante no pós-operatório ortopédico, especialmente em:
Redução da dor
A acupuntura:
modula a liberação de endorfinas, serotonina e outros neurotransmissores analgésicos;
reduz a sensibilização do sistema nervoso central;
diminui a necessidade de opioides e analgésicos em muitos pacientes.
Isso se traduz em uma recuperação mais confortável e com menos efeitos colaterais de medicamentos.
Controle do edema e inflamação

A inserção de agulhas estimula:
microcirculação local,
liberação de substâncias anti-inflamatórias,
reorganização da drenagem linfática.
Pacientes frequentemente relatam sensação de leveza e diminuição do inchaço logo nas primeiras sessões.
Melhora da mobilidade e retorno da função
Ao reduzir dor e tensão reflexa, a acupuntura facilita movimentos e acelera o ganho de amplitude articular. Isso potencializa o trabalho da fisioterapia, que continua sendo o pilar principal da reabilitação.
Ademais, a imobilização prolongado cursa com a formação de pontos gatilhos miofasciais, e a acupuntura é uma das intervenções com melhor resposta clínica para liberação desses pontos de contratura muscular e tratamento da Síndrome Dolorosa Miofascial.
Controle da cicatrização e maleabilidade da pele
O processo de cicatrização consiste no preenchimento da área lesionada por colágeno, buscando o restabelecimento da integridade do tecido. Nosso corpo possui diferentes tipos de colágenos, alguns mais densos e duros e outros mais elásticos e flexíveis.
O colágeno tipo III é mais predominante nas fases iniciais da cicatrização e é mais elástico, enquanto o colágeno tipo I é mais rígido e predomina na fase de remodelação, conferindo resistência. A literatura científica indica que pode haver uma contribuição da acupuntura nessa transição e organização das fibras, favorecendo uma proporção que resulta em uma cicatriz mais funcional e elástica.
Regularização do sono e diminuição da ansiedade
O pós-operatório costuma ser um período de grande vulnerabilidade emocional. Ao modular o sistema nervoso autônomo, a acupuntura ajuda a:
desacelerar a mente,
melhorar a qualidade do sono,
reduzir ansiedade, irritabilidade e medo de se movimentar.
E, como sabemos, um corpo que dorme melhor, cicatriza melhor.
Ainda sobre o sono, muitas pessoas se acostumam ao longo da vida a dormir sempre na mesma posição, e a acupuntura, ao aliviar a dor e as contraturas musculares, facilita para que as pessoas consigam retornar mais rapidamente para a posição que para elas é mais confortável no sono.
Como a Acupuntura explica esse processo? A visão da Medicina Chinesa
Na Medicina Tradicional Chinesa (MTC), o trauma gera:
estagnação de Qi e Xue (energia e sangue), associada à dor e rigidez;
acúmulo de Umidade, relacionado ao edema;
desequilíbrio entre Yin e Yang na região afetada.
A acupuntura busca:
mover o Qi para aliviar dor,
estimular o fluxo de Xue para nutrir tecidos e acelerar cicatrização,
dispersar a Umidade, reduzindo inchaço,
harmonizar meridianos, recuperando a integração funcional do membro.
Pontes entre MTC e biomedicina mostram coerência entre essas duas leituras do mesmo fenômeno, mas compreendo que esses conceitos soem de forma abstrata para quem nunca foi introduzido a essa racionalidade médica anteriormente.
E como isso aparece na prática clínica?
Cada pós-operatório é único, mas, de forma geral, trabalhamos com:
Pontos locais
Usados com técnicas suaves quando há inchaço ou operamos próximas ao sítio cirúrgico. Favorecem circulação, reduzem dor, melhoram a cicatrização e liberam pontos gatilhos miofasciais próximos.
Pontos distais
Permitem tratar mesmo quando a área operada ainda não pode ser tocada. Exemplos: pontos em mãos, tornozelos ou orelha que modulam dor em joelho, coluna, ombro ou quadril.
Técnicas complementares
moxabustão,
eletroacupuntura,
ventosaterapia.
Quando iniciar? É seguro?
A acupuntura é uma prática segura, e os riscos associados são minimizados quando aplicada por médicos especialistas na área, com títulos de especialista reconhecidos pelo Conselho Federal de Medicina.
A acupuntura pode ser realizada, inclusive, antes da indicação cirúrgica, como em condições clínicas que possibilitam um tratamento conservador. Em algumas situações, como traumas recentes, o corpo precisa de um período para reduzir a inflamação no local da fratura e então realizar os procedimentos operatórios. Nesses casos, o médico acupunturista pode atuar inclusive em hospitais para o manejo da dor até a realização da cirurgia.
Após a cirurgia, quanto antes for iniciada a acupuntura, mais efetivos tendem a ser os resultados. O médico acupunturista, muitas vezes, pode articular seu tratamento com o médico ortopedista.
A maior parte das pessoas, no entanto, acaba iniciando a acupuntura apenas após receber alta hospitalar. Nesses casos, a acupuntura pode ser iniciada a qualquer momento.
Minha experiência pessoal: quando o paciente vira médico
Durante minha própria reabilitação, percebi algo que mudou minha maneira de entender o cuidado:
A acupuntura não agiu apenas na minha dor, ela me devolveu autonomia.
O pós-operatório costuma nos colocar em um lugar de dependência de medicamentos, de profissionais, da nossa família da própria fragilidade. A acupuntura me ajudou a reconstruir uma relação de cooperação com meu corpo, algo que carreguei para a minha prática clínica.
Por que integrar acupuntura e fisioterapia?
Essas duas áreas não competem, elas se complementam.
A acupuntura:
prepara o terreno,
reduz dor,
diminui reflexos de proteção,
ajuda a restaurar equilíbrio neurofuncional.
A fisioterapia:
devolve mobilidade,
fortalece,
reeduca movimento,
garante retorno à vida cotidiana.
Na prática, a combinação encurta tempo de reabilitação e aumenta a qualidade do resultado.
Quando a acupuntura pode ser especialmente útil no pós-operatório ortopédico?
prótese de joelho ou quadril
reconstrução de ligamento cruzado anterior (LCA)
fraturas com fixação interna (placas, parafusos, hastes)
cirurgias de coluna
artroscopias
reparos tendíneos (ombro, tornozelo, mão)
Em todas essas situações, há evidências de melhora na dor e na função quando a acupuntura é utilizada de forma complementar.
Inclusive, algumas situações, como fratura de costelas, não tem indicação de cirurgia e são extremamente dolorosas, inclusive durante a respiração. Nesses casos, a Acupuntura acaba se tornando uma das mais importantes abordagens de tratamento.
Um cuidado que olha para toda a pessoa
Por fim, a acupuntura não trata apenas a lesão, mas a pessoa que vive a lesão. Muitos pacientes chegam ao consultório dizendo:
“estou travado de medo de apoiar a perna”,
“estou dormindo mal”,
“me sinto vulnerável”,
“parece que o corpo perdeu o ritmo”.
A acupuntura ajuda a reorganizar esse conjunto físico, emocional e até existencial que compõe o processo de cura.
A acupuntura não substitui a cirurgia, a fisioterapia ou os cuidados tradicionais.Mas quando integrada de forma responsável e personalizada, pode ser uma poderosa aliada na recuperação pós-operatória ortopédica: acelera processos naturais de cicatrização, reduz dor, melhora mobilidade e contribui para um retorno mais confiante à vida cotidiana.
Minha experiência como paciente e como médico reforça: cuidar é alinhar ciência, técnica e humanidade, e a acupuntura tem muito a oferecer nesse caminho.
Se essa forma de cuidar faz sentido para você, em Luís Eduardo Magalhães (Bahia) eu posso te auxiliar a lidar com a dor e recuperação pós-operatória. Atendo na Clínica Lago e na Clínica Desenvolver.
Dr. Paulo Henrique Mai
Médico de Família e Acupunturista, titular do Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura
CRM/BA 49.425 - RQE 28.147 / 28.148



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